16 de mai. de 2011

O jogo

"Eu preciso botar pra fora. E não sei fazer isso sem ser escrevendo. (..) Ele quis, eu quis, nós quisemos. Sempre em momentos diferentes. (..) E eu não sei me controlar, porque minhas vontades ficam perdidas quando eu fico perto dele. E ele deve saber disso, porque ele usa essas informações a favor dele como se fosse um jogo. Na verdade, é um jogo. E eu to perdendo feio. Deixei as cartas à mostra, mostrei minhas táticas de jogo. Não tenho mais nenhuma vantagem. Parece que nós só vamos nos entender, se é que vamos, quando a gente chegar num empate técnico. Que agora está bem longe da realidade, porque ele ta dominando o jogo. E eu deixei isso acontecer passivamente, voluntariamente. Sinceramente, eu odeio jogos. (..) Mas não posso deixar que tudo seja perdido por falta de atenção, de cuidado, de minúcia e de análise dos movimentos. Por mais que eu queira que ele seja meu parceiro e jogue do meu lado, primeiro preciso provar a ele que eu sou tão esperta quanto ele. Sabe, como nos filmes? A gente só quer do nosso lado, jogando com a gente, quem a gente acha merecedor dessa posição. Aparentemente, eu sou agora uma oponente que agrada como rival, mas ainda não cheguei ao titulo de parceira. E quer saber? Eu também sinto isso. Eu gosto dele, de jogar com ele. Gosto das horas em que nós nos divertimos. Mas não parei pra analisar se ele merece. Nunca perguntei isso pra ele, nem mostrei que eu queria saber. O que estava em jogo sempre foi a minha fidelidade, a minha competência, a minha dignidade, a minha verdade. E a dele? Se ele precisa de tanto pra me ter como parceira, porque não pode admitir que eu também precise das mesmas coisas? Porque eu nunca deixei isso claro. Porque eu não admiti pra mim mesma que havia essa necessidade. EU preciso saber, também. Se você merece minha confiança, meu crédito, minha fidelidade, se você merece minha entrega. Não quero um parceiro de crime pela metade. Ou o crime é perfeito ou não é. E pra um crime perfeito tudo tem que ser bilateral: a confiança, a crença, o amor, a dedicação, a verdade, a fidelidade. Eu não preciso provar nada sozinha, porque não estou concorrendo a uma vaga em que vou jogar sozinha. Um parceiro que queira o meu respeito precisa me encorajar a encontrar os motivos desse respeito. Estar disposto a me valorizar e a mostrar quão valiosa eu posso ser, caso ele me tenha ao seu lado. Eu não sou a única que precisa provar se sou digna de subir de posto. Ele precisa me provar se eu devo querer isso, se eu devo lutar por isso. Até agora eu lutei por isso porque achei que fosse o certo, porque fui cegada por atitudes acumuladas, erradas, da minha parte. Mas agora os erros ficaram no passado, não sou mais escrava deles. O jogo continua, e os erros do passado só servem pra mostrar a tática que permanece e a que deve ficar pra trás. Se você me quer ao seu lado, também tem que me provar. Também precisa passar pelo labirinto da paciência, do merecimento, da coragem. Esse tempo todo eu tentei provar sozinha que posso ser sua parceira, mas não sou eu a única em teste. Estamos ambos em teste. Você está várias jogadas na minha frente, porque me conhece mais do que eu lhe conheço. Agora vou mudar de tática. Vou esconder meus segredos e meus truques. Se você quiser conhecê-los, vai ter que investigar melhor. Isso significa que você não esta mais protegido como esteve um dia, e que eu vou jogar com armas novas, que você não conhece. Porque minha força de vontade e minha vontade de vencer aumentaram, porque você me enganou. Aproveitou-se da minha fraqueza pra avançar no jogo e me deixar pra trás. E eu sei que nós só vamos poder conversar quando estivermos no mesmo espaço do tabuleiro. Não se preocupe, eu vou lhe alcançar."

Beatrice Cartiller

Um bem pequeno..

A minha vontade de escrever vem de situações externas, que me incomodam ou incitam internamente. Ou de internalidades que eu sinto vontade de compartilhar. Mas sempre tem algum motivo escondido, que nem sempre eu consigo decifrar até terminar de escrever.

Esses últimos dias eu andei reparando em alguns comportamentos que a gente tem, sem perceber. E dois deles me chamaram a atenção, sendo representativos de um conjunto muito maior. O pneu do meu carro furou, o namorado da minha roomate foi me ajudar, de repente tinham mais 5 homens além dele ajudando no processo de troca do pneu, se alternando e se mostrando extremamente solícitos. Eu não disse uma palavra, ou pouquíssimas, porque eu estava no meio de um “negócio de homens”. Sinceramente, nem fazia questão de que fosse diferente. Concluí que toda mulher é independente até seu pneu furar. Outra situação foi uma rotineira, que já vi acontecer algumas vezes, que é a ajuda entre as camareiras, quando uma delas está atrasada no serviço. Precisam terminar a arrumação num tempo determinado, e às vezes não conseguem. Nesses casos, juntam duas, três e até mesmo quatro para se ajudarem. Veja, nos dois casos, nenhum ganho explícito existia. Era ajuda, mesmo, altruísta. Pela classe masculina, com o seu ego, onde trocar um pneu é questão de masculinidade, ou pela amizade das mulheres – nem sempre sincera, no entanto. De qualquer forma, me chamou a atenção como foi fácil conseguir ajuda pra trocar o pneu, e como é obvio pras camareiras (as que eu tive acesso direto) que se uma não acaba o trabalho a tempo, as outras vão ajudar.

O que eu tirei disso? Fiquei pensando em quantos comportamentos do tipo acontecem, o tempo todo, em casa, no trabalho, na rua, na farmácia, no supermercado, na fila do banco, no trânsito. As pessoas estão acostumadas a falar mal da humanidade e a dizer que está tudo errado. Comportamento-padrão, pode-se dizer. Reconheço que também recaio no erro algumas vezes. Mas depois de reparar nessas pequenas atitudes, de gentileza, amizade, espírito de grupo, cooperação, eu fico pensando como eles são colocados no segundo plano, e nunca estão nos jornais. Perderam o valor. Só que eu não entendo como. Porque, se as pessoas reclamam tanto das desgraças, é porque esperam que as coisas sejam melhores, ou não é? Então porque é que esses comportamentos não são nem comuns, nem valorizados, nem o normal que se espera das pessoas? Andamos muito preocupados em dar sentido e “educação” à humanidade inteira, mas esquecemos que essa mudança pode – e deve – começar de onde é possível: comigo, com você, aonde nós formos e isso for possível. A endemia não é curada em todos ao mesmo tempo. Requer pesquisa, testes, cobaias, projetos piloto, e só depois é que os remédios vão para as farmácias, e a cura é democratizada. Tudo faz parte de um processo.

EU fico pensando como seriam as coisas se, cada um de nós fizesse um pouco mais de esforço em multiplicar essas atitudes positivas. Sabe aquele filme “A corrente do Bem”? Se cada um pudesse ajudar com o que lhe cabe, e PERDESSE UM POUCO DO SEU TEMPO FAZENDO-O, as coisas seriam gradativamente diferentes. Mas é muito mais cômodo reclamar, culpar o governo e a sociedade. Esquecemos que a sociedade é composta de indivíduos, e estamos entre eles. Vamos dizer que o problema grande, o bem maior, nós não somos capazes de resolver sozinhos. Mas cada um de nós pode contribuir com “bens pequenos”, e a soma deles pode levar a algum lugar. Na pior das hipóteses, a sensação de humanidade e a gratidão das pessoas a quem ajudamos é significante o suficiente. E isso pode ser feito de várias formas. Não precisa fazer trabalho voluntário, não precisa doar, fazer caridade, se você não tiver tempo, dinheiro, ou disponibilidade. Você pode ajudar alguém que esteja fora do seu ambiente de conforto, sorrir pra um desconhecido, ser mais educada e gentil com os idosos, entender as crianças e não tirar delas o direito de sonhar, dar um crédito aos marginalizados pela sociedade, ouvir um amigo, dar um presente simbólico a alguém que está triste, não é difícil.. Basta SER humano.

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